Primeiras audiências mostram rejeição unânime a pedágio com taxa de outorga no Paraná
08 de fevereiro, 2021
As primeiras audiências públicas sobre as novas concessões do pedágio realizadas pela Assembleia Legislativa, ontem, em Cascavel e Foz do Iguaçu, mostraram uma rejeição praticamente unânime dos participantes – deputados, prefeitos, vereadores, e representantes da sociedade civil organizada e do setor produtivo – ao modelo híbrido proposto pelo Ministério da Infraestrutura, de licitação pelo menor preço com desconto limitado e cobrança de taxa de outorga como critério de desempate. O consenso geral é de que o modelo apresentado por técnicos do governo federal pode ser extremamente prejudicial para a população e à economia do Estado e pode repetir os mesmos problemas do pedágio implementado há 24 anos, composto por tarifas altas com reajustes sistemáticos e sem o cumprimento do cronograma de obras e investimentos.
O modelo proposto pelo governo federal prevê um investimento de R$ 42 bilhões nos 30 anos de concessão. Serão implementadas 42 duas praças de pedágio - 15 a mais que atualmente - divididas em seis lotes, em uma extensão de mais de 3,3 mil quilômetros de rodovias pedagiadas. A Taxa Interna de Retorno (TIR) regulatória adotada é de 8,47%. A TIR é um método utilizado para análise de viabilidade de projetos de investimento. O desconto inicial na tarifa do leilão é de cerca de 15% a 17%. Está prevista a duplicação de 1.700 quilômetros nos primeiros sete anos de concessão, com degrau tarifário de até 40% após a conclusão das obras.
Os encontros realizados na Associação Comercial e Industrial de Cascavel e na Associação Comercial e Empresarial de Foz do Iguaçu foram os primeiros de uma série de 10 audiências que acontecerão nas principais cidades paranaenses. Em ambos, parlamentares, políticos locais e empresários criticaram o modelo proposto pelo governo federal e defenderam a licitação pelo menor preço. Em Foz, o primeiro-secretário da Assembleia Legislativa, deputado Luiz Cláudio Romanelli (PSB), anunciou que a Casa deve votar, nos próximos dias, projeto que proíbe o governo do Paraná de fazer concessões de rodovias com outro critério que não o de menor tarifa. Caso aprovado, o projeto retiraria da concessão 1.164 quilômetros de rodovias estaduais, ou 35% do trajeto original da proposta do Ministério da Infraestrutura.
Segundo Romanelli, o modelo híbrido representa um risco, já que o desconto está limitado em um valor entre 15 e 20%, o que pode representar no futuro uma tarifa com o valor que pode chegar a 80% dos preços praticados atualmente. "As atuais tarifas não podem ser o critério de desconto. Estes valores têm impacto na economia e competitividade do Estado", avaliou. O deputado disse ainda que o modelo inclui o chamado degrau tarifário, que representa o aumento da tarifa compulsoriamente em até 40% após a realização das obras e duplicações. O parlamentar frisou também que, especificamente para na região Oeste, serão criadas quatro novas praças de pedágio. "As cidades de Cascavel, Toledo e Foz do Iguaçu estarão cercadas por pedágios", disse.
Para Romanelli, três critérios deverão ser adotados na nova modelagem de concessão: menor preço, mais obras e em menos tempo. "Caso contrário, com este modelo proposto, nós vamos ter na prática o aumento da tarifa ao invés de uma oferta de menor preço. Não somos obrigados a pagar uma taxa de outorga que não garante as obras. Se o contrato não for bem amarrado, podemos repetir os erros do passado. Temos de mudar isso. Estamos vivendo um momento de perigo para nossa economia ", disse Romanelli.
O coordenador da Frente Parlamentar sobre o Pedágio, da Assembleia, deputado Arilson Chiorato (PT), concordou. "Este é um tema polêmico e importante. Ontem conhecemos o projeto do Governo Federal, com o modelo híbrido que traz a figura da outorga onerosa. Este modelo proposto é nocivo para o povo do Paraná. Temos de salvar o Paraná de mais um contrato que pode prejudicar o setor produtivo do Estado", afirmou Chiorato. para ele, repúdio é a palavra que marcou a primeira audiência pública em Cascavel sobre o novo modelo de pedágio proposto pelo Ministério da Infraestrutura.
Participações
Com grande participação popular, tanto presencialmente (respeitando os protocolos sanitários de distanciamento e uso de máscaras) quanto de forma virtual, a audiência reuniu prefeitos e vereadores da região, além de representantes da sociedade. Para o prefeito de Cascavel, Leonaldo Paranhos, as novas concessões não podem repetir os erros do passado. "Dessa vez, não será permitido o oportunismo ou interesse financeiro. O Paraná não vai aceitar nenhum tipo de manobra. Queremos um contrato realizado de forma transparente e clara. Precisamos de um modelo que possa atender às nossas necessidades. Desta vez, é a população quem decide", disse.
O presidente da Câmara de Vereadores de Cascavel, Alécio Espínola, representou os outros 20 vereadores do município presentes na reunião. Ele concordou com os demais oradores. "Devemos lutar pelos interesses de nossa região", disse. Já o presidente da ACIC, Michel Vitor Alves Lopes, leu um documento em nome da entidade revelando os sentimentos dos empresários da cidade em relação ao pedágio. A carta será enviada aos principais poderes do Estado como representação das ideias da audiência. "Queremos construir um modelo ideal junto com as autoridades. O custo logístico do pedágio ceifou investimentos em nossa região. Nossa população e empresas não aguentam mais isso", desabafou.
Deputados
“A melhor proposta é de menor tarifa e precisamos do povo do Paraná unido”, defendeu o deputado Evandro Araújo (PSC). “Tirando a pandemia, esse é o assunto mais importante para o estado. É uma responsabilidade e não podemos errar. Toda a sociedade tem que discutir e não apenas o governo. O antigo pedágio é um pesadelo”, destacou o deputado Tercilio Turini (CDN). “O momento é de debater o tema e ampliar a participação da comunidade para não deixar que o modelo de pedágio apresentado pelo Governo Federal seja implantado no Paraná. Estão propondo 15 novas praças de pedágio, tarifas ainda caras e receita de centenas de bilhões de reais para as concessionárias. Não é isso que os paranaenses querem. O Paraná não pode ser ainda mais prejudicado em concessões de 30 anos”, afirmou.
Segundo o deputado Homero Marchese (PROS), o modelo de pedágio proposto pelo Governo Federal é muito semelhante com a atual modelagem de concessões de rodovias. “O modelo apresentado tem tarifa alta e os mesmos riscos de aumento de tarifa anualmente, sem a obrigação de realização das devidas obras. É preciso pensar numa opção diferente com o preço menor e obras feitas. Há vários aspectos, como preço e degrau tarifado que precisam ser debatidos. Mas é preciso defender o usuário e não a concessionaria”, explicou.
Tarifas baixas
“Nós temos 2.500 quilômetros de estradas pedagiadas com 20 praças. O novo modelo apresenta 15 novas praças para apenas cerca de 800 quilômetros a mais de rodovias com pedágio. É um pedágio pior que está vindo por aí. Sou contra essas novas praças, principalmente a praça entre Toledo e Cascavel”, afirmou o deputado Delegado Recalcatti (PSD). “Por que não fazer um contrato de 10 anos no lugar de um de 30? Por que não usar o Exército Brasileiro na manutenção de estradas? Podemos ter outros modelos de administração de estradas”, sugeriu o deputado Subtenente Everton (PSL).
Lideranças
Representantes da sociedade civil organizada de Cascavel e de toda região oeste também se manifestaram contrários ao modelo de concessão apresentado pelo Governo Federal. “As concessionárias se sentaram com os governantes e resolveram seus problemas. Não ouviu os usuários. O momento é de discutir e apresentar os nossos contrapontos às empresas e ao governo. Mas garanto que o modelo de outorga não garante investimento nenhum”, afirmou o representantes do Programa Oeste Desenvolvimento, Edson Vasconcellos.
Rodrigo Cirilo, presidente da Associação Paraná Menos Pedágio foi enfático ao afirmar que o Paraná não pode aceitar o modelo proposto pelo Governo Federal. “Nós pagamos a conta de um preço que não é justo. Os dados foram apresentados e esse modelo precisa ser renegado. É preciso pensar numa proposta, que seja do agrado de nós paranaenses. O Paraná exige respeito. Não queremos novas praças. Vamos lutar para que nossos diretos sejam respeitados. Que vença o preço justo”, disse.
“O Paraná está sufocado e precisa respirar. Esse pedágio sufoca empresários e cidadãos. Nós da construção civil precisamos de insumos, que estão cada vez mais caros justamente por causa das tarifas de pedágio praticadas em todo o estado. Esse sufoco impede o crescimento da economia. Precisamos de emprego e com pedágio caro isso não acontece”, alertou o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Cascavel, Roberto Americano.
Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de Cascavel, Jurandir Parzianello Junior, é necessária mais transparência no debate que envolve o novo modelo de pedágio do estado. “Precisamos que as próximas audiências ocorram com acesso a todas as informações sobre a nova modelagem para que o debate seja produtivo. O setor produtivo não aguenta mais esse modelo de pedágio e a sociedade paranaense não suporta mais ser enganada. Queremos transparência durante todo o processo, do debate ao fechamento de contrato. Precisamos abrir a caixa de ferramenta. Chega de caixa preta da concessionarias”, declarou.
“Estamos na região mais distante do estado e o pedágio pesa muito pra nós do Oeste. As cooperativas se juntaram há quatro anos e pagamos uma auditoria e vimos de perto o custo pesado dessa taxa pro setor produtivo da região. Estamos encaminhando para gerar 100 mil empregos diretos nos próximos dois anos e cada emprego na agricultura gera 17 empregos indiretos. Por isso precisamos muito de um novo modelo. É o momento da virada”, destacou o presidente da Cooperativa Lar, Irineo Costa Rodrigues.
Em Foz, a posição contrário ao projeto federal também foi unânime. “Pelas poucas informações recebidas e o histórico de 24 anos do atual contrato amedronta e nos posicionamos contra o modelo com qualquer incidência de outorga onerosa que de fato será repassada a nós usuários das tarifas de pedágio disfarçada em forma de mais um tributo, como se pagássemos poucos tributos no país”, disse Danilo Vendruscolo, vice-presidente da Associação Comercial e Empresarial de Foz do Iguaçu (Acifi), durante a audiência.
Um exemplo apresentado por Vendruscolo foi a tarifa do trecho da rodovia BR-277 entre São Miguel do Iguaçu e Medianeira. Atualmente o valor do pedágio é de R$ 17,00. A projeção da nova concessão seria uma tarifa no valor de R$ 10,14 e após a duplicação e a aplicação do degrau tarifário chegaria a R$ 14,19. “Apenas 16,5% menor que as tarifas atuais”, disse. “Distante das nossas expectativas de redução em torno de 50%, principalmente das cooperativas agropecuárias do Oeste, que em 2020 faturaram mais de R$ 30 bi e empregam mais de 60 mil trabalhadores diretos e 120 mil indiretos”, completou.
O presidente da Acifi fez um panorama das obras que estão sendo realizadas na região, onde começa o maior corredor logístico ligando o Porto de Paranaguá, além de conexões com os portos do Chile, Argentina e Uruguai, citando como exemplo a segunda ponte na ligação entre o Brasil e o Paraguai. “Com essas obras iremos nos consolidar como o polo de referência do Mercosul. Precisamos reduzir nossos custos logísticos em 50%, com maior competitividade para desenvolver nossa região, com mais emprego, renda e desenvolvimento social”.
Segundo ele, com a nova ponte e tarifas de pedágio mais baixas, será possível fazer com que o Paraguai retorne a sua exportação via Porto de Paranaguá. Vendrusculo usou como exemplo a soja colhida no Paraguai e escoada pela Bacia do Rio da Prata que tem um custo de frete 35% menor do que a soja do Oeste do Paraná.
“Queremos soluções viáveis que contemplem o coletivo, até porque em nenhum momento nós, das bases do Oeste, fomos consultados, ouvidos para a construção desse modelo apresentado para os próximos 30 anos. Discordamos das projeções de tarifas no início do contrato e após a entrega das obras projetadas”, afirmou.
“Acreditamos ser possível construirmos juntos, sociedade e governo, uma modelagem que nos atenda, tanto nas tarifas como também nos ajustes dos cronogramas das obras e no programa de investimento por parte das novas concessionárias. Não podemos cometer o erro de repetir a história dos últimos 24 anos pagando o pedágio mais caro do Brasil” finalizou.
Posição semelhante é o do presidente do Programa Oeste Desenvolvimento (POD), Rainer Zielasko, e das mais de 100 entidades que representa. O POD quer uma licitação sem modelo de outorga; licitação pelo modelo de maior desconto inicial; degrau tarifário menor do que os 40% propostos.
Zielasko entregou ao presidente da República, Jair Bolsonaro, na última quinta-feira (4), uma carta reivindicatória assinada por mais de 100 entidades do Oeste. “Percebe-se que esse modelo não tem novidade significativa em relação ao modelo anterior. A falta de informações não nos permite fazer um estudo mais profundo. Falta a planilha de custo e de transparência”, argumentou. “Somos partidários, precisamos de um pedágio mais justo e que caiba no bolso dos empresários do Oeste do Paraná. Queremos isonomia, competitividade como acontece com os demais estados”, completou.
Na quinta-feira (11) a audiência pública será realizada em Londrina, a partir das 9 horas na Sociedade Rural do Paraná/ Parque de Exposições e na sexta-feira (12) em Cornélio Procópio, a partir das 8h30 no auditório da Universidade Técnica Federal do Paraná (UTFPR).
Fonte: Bem Paraná Foto: Divulgação