02 de setembro, 2020
A pandemia já gerou um reflexo muito forte nos hábitos de consumo, levando pessoas que, por exemplo, nunca haviam feito compras em farmácias ou supermercados de forma on-line, passarem a comprar assim de forma habitual. Esses hábitos não vão retroagir e a venda de produtos do fabricante direto para o consumidor (o direct-to-consumer), que já era uma tendência, se tornará uma prática comercial permanente.
As empresas que eram off-line se viram obrigadas a fazer grandes investimentos em e-commerce durante a pandemia e é claro que não vão jogar isso fora quando o lockdown terminar. Elas continuaram vendendo on-line e precisaram cada vez ser mais competitivas, pois os consumidores demandaram isso e a concorrência on-line vai ficar ainda mais acirrada. “Sem uma plataforma digital de fretes vai ser muito difícil ser competitivo no novo varejo da pós-pandemia, porque haverá maior capilaridade de entrega, demanda por prazos curtos e compras cada vez mais fracionadas para múltiplos destinos”, destaca o CEO da TruggHub, Alexandre Coelho.
A TruggHub é especializada em marketplace de cargas fracionadas. “Na verdade, somos o primeiro do Brasil a fazer algo assim, talvez o primeiro do mundo. Existem diversos outros marketplaces de frete no Brasil e no mundo. É um mercado em formação. Mas a lógica dos outros marketplaces mais ou menos se repete, pois consiste apenas em conectar alguém que quer transportar com alguém que presta esse serviço. Nós optamos por fazer diferente e compartilhar os riscos com nossos clientes, pois assumimos uma posição dentro da cadeia de suprimento, participando da operação e não apenas provendo os meios tecnológico para isso”, explica Alexandre.
A equipe da Revista FETRANSPAR conversou com o CEO da TruggHub. Detalhes deste bate-papo você confere abaixo:
REVISTA FETRANSPAR: A TruggHub nasce em que ano? Tem quantos profissionais? Quais os tipos de serviços utilizados? Têm quantos clientes em carteira ou que passaram pela estrutura? É 100% paranaense? É a única a oferecer soluções digitais para cargas fracionadas no Paraná ou no Brasil?
ALEXANDRE COELHO: A TruggHub foi fundada em 1º de maio de 2019, era feriado, mas estávamos trabalhando (risos). Fizemos uma reunião em que definimos o nome e as diretrizes da empresa. E se me permite, vou aproveitar pra explicar o porquê do nome… primeiro de tudo, queríamos um nome global, pois criamos a empresa já com uma mentalidade global, tendo a internacionalização como um premissa, por isso deveria já ter um site “.com” desde o início. Depois foi o desafio de expressar o modelo que queríamos construir, que era o de um ambiente digital de negócios que reforçasse os laços de confiança entres os seus membros, pois a falta de confiança gerava custos com excesso de controle e limitava o fluxo de negócios.
Depois de muitas sugestões e tentativas, chegamos ao acrônimo “Trugg”, que significa “Trusty Global Gears”, algo como um mecanismo de alcance global em que se pode confiar. O acréscimo do “Hub” foi para representar essa primeira solução que é a plataforma de integração de serviços de logística para cargas fracionadas. A empresa foi criada em Curitiba, mas estamos abrindo a filial de São Paulo em setembro e já planejando as filiais de Florianópolis, Porto Alegre e Belo Horizonte a partir do ano que vem. Hoje contamos com 20 pessoas na operação, mas estamos contratando mais. Entendemos que a logística de cargas fracionadas não se resolve apenas com tecnologia, mas com a adequada orquestração de pessoas e ativos logísticos trabalhando em sinergia.
Temos clientes de diversos portes e segmentos, mas com um problema em comum, a logística de cargas fracionadas, que as vezes se apresenta na distribuição de seus produtos e outras vezes na movimentação de cargas entre as unidades de produção, como o caso do frete Spot que grandes empresas têm nos procurado para lidar melhor.
Nosso conceito é de ecossistema de negócios, com interrelações controladas e auditáveis, para gerar uma rede confiável de atores logísticos que compartilham vantagens e benefícios, colaborando para otimizar suas operações. Por isso estamos conectando à nossa plataforma várias soluções adicionais, como seguros, crédito, conta digital, serviços de consultoria e tudo mais que possa fortalecer as relações entre os participantes da nossa rede. Nossa visão é simplificar a logística de cargas fracionadas ao ponto de ser simples entregar um produto na cidade vizinha ou em um país do outro lado do planeta. Precisamos de embarcadores e transportadores inovadores ao nosso lado para poder chegar lá.
RF: O que é ‘digitalizar’ o transporte de cargas fracionadas? Como entender esse termo quando se por muitos anos pensamos neste tipo de transporte como algo físico que sai de um destino para outro?
AC: Exato! Eu sempre procuro fazer essa mesma distinção quando falo de logística digital, porque é inafastável a percepção de algo físico, tangível, quando se fala em logística. Mas é preciso entender o que é logística para se compreender o fenômeno da logística digital. A histórica da logística surge com a guerra, quando os generais precisavam dimensionar os recursos necessários para abastecer suas tropas no front.
Assim, os generais da Grécia antiga dispunham dos “Logistikas“, que eram os responsáveis por efetuar os cálculos para alocar os recursos financeiros e materiais necessários para o sucesso das campanhas militares.
A apropriação ocidental deste termo gerou modernamente a logística como ciência que estuda a otimização de recursos financeiros e materiais para otimizar o abastecimento de produtos e serviços. Ou seja, logística não consiste em transportar ou armazenar. Logística consiste em “racionalizar” o transporte, a armazenagem ou qualquer outra atividade ligada à cadeia de suprimento. Então, a logística digital não transporta ou armazena digitalmente, pois é impossível no momento (rs), mas ela racionaliza digitalmente os processos logísticos, aplicando os conceitos da economia digital, como a conectividade, a escalabilidade, o compartilhamento de dados e ativos, o pensamento ágil, o data-driven, etc.
RF: Como surgiu essa ideia de oferecer esse serviço para o transportador de Cargas?
AC: Começamos com a ideia por entregar mais tecnologia para as transportadoras, mas logo nos primeiros testes de mercado entendemos que esse não era o caminho… oferta de tecnologia para o transporte tem muita! Não faltam opções. A barreira de adoção não é a oferta de tecnologia, é a cultura do setor. Percebemos que não adiantava empurrar a tecnologia goela abaixo para as transportadoras. Era preciso criar uma ponte digital entre o embarcador e a transportadora, que envolvesse também todos os demais agentes dessa enorme rede de abastecimento. Assim a adoção da tecnologia estaria integrada ao dia a dia, formando lentamente novos hábitos digitais, sem choques culturais e com uma comunicação mais fluida para promover a colaboração, não a competição.
RF: Quais os benefícios específicos para o transportador de cargas que resolve utilizar desta plataforma? Financeiro? Segurança? Agilidade? Processo? Documentação? Orçamento?
AC: Esse é um ponto que eu gosto muito de esclarecer! Pois muita gente me pergunta se as transportadoras não se sentem ameaçadas pelo nosso modelo. Eu digo que aquelas que entendem o modelo e fazem uma conta simples, logo percebem que não somos ameaça, somos agregadores. Veja, nós buscamos a redução do preço do frete fracionado com o nosso modelo, esse é o principal benefício para os embarcadores que nos acionam. Mas oferecer um preço de frete fracionado menor para o embarcador, no nosso modelo, não é algo predatório, pois junto com o preço menor, vem a redução de custo e a redução do risco. Risco é um componente importante do preço do frete. O risco se traduz nos custos de seguro e gerenciamento de risco que são adicionados ao preço, proporcionalmente ao valor da carga. Então, quando assumimos o fluxo de pagamentos, quando negociamos coberturas de seguro, quando repassamos dados em tempo real e quando validamos automaticamente documentos e agentes intervenientes, nós já reduzimos o risco. A transportadora, por exemplo, recebe o pagamento de nós, não de um embarcador eventual que ela nunca fez negócios antes.
Como eu disse antes, nós participamos do risco junto com os nossos clientes e parceiros, por isso sentimos na pele quando as coisas não dão certo e atuamos para melhorar o processo e garantir mais segurança.
Mas, sobretudo, nossa lógica de negócio é o de aumentar o aproveitamento da capacidade de carga dos veículos, evitando que rodem vazio ou com pouca carga, e mesmo evitando que fiquem parados por falta de demanda. Isso se chama maximização de rentabilização de ativos. O caminhão, a carreta, o armazém, são ativos logísticos e o lucro da operação vem da monetização desses ativos. Se um caminhão roda em média com 60% da sua capacidade, o lucro é pequeno, mas se você aumenta esse aproveitamento para 70 ou 80%, o lucro é muito maior.
Com uma plataforma digital de cargas fracionadas gerenciando a demanda, os transportadores parceiros conseguem aumentar esse aproveitamento, podendo ofertar preços menores sem comprometer o lucro da operação, pois junto vem a redução dos custos.
RF: Como a TruggHub tem atuado durante a pandemia junto aos transportadores de cargas? Pode citar um exemplo concreto de ação eficaz?
AC: Acredito que a nossa maior contribuição para as transportadoras parceiras nesse período de pandemia foi na geração de demandas de negócio. O setor, como se sabe, foi muito atingido e as transportadoras perderam muito em volume de entregas dos seus clientes e até mesmo perderam muitos clientes que suspenderam a produção ou fecharam as portas em definitivo. A solução para muitas foi reduzir de tamanho e buscar novos clientes, só que muitas não tinham a agilidade comercial necessária para prospectar novos negócios. Porém, quem estava conosco durante a pandemia ou foi se tornando parceiro com o tempo, pode acessar novos embarcadores e fazer rapidamente novos negócios, algo que levaria meses para acontecer pelo processo comercial convencional (off-line), que normalmente consumia diversas reuniões presenciais. Além disso nós também lançamos serviços de apoio, como um site e um app mobile para orientar os caminhoneiros nas estradas durante a pandemia, oferecemos serviços gratuitos para quem embarca ou transporta gêneros de primeira necessidade e produtos de higiene e limpeza e levantamos demandas de cargas dedicadas junto a clientes embarcadores para reforçar a demanda para além das cargas fracionadas.
RF: De forma geral como as empresas de transporte de cargas estão recebendo esse serviço no Paraná? Quais são as principais barreiras a serem superadas?
AC: Eu realmente não tenho dados específicos dos parceiros do Paraná, mas de modo geral a receptividade é positiva quando temos a oportunidade de evidenciar as vantagens do nosso modelo e mostrar que somos um caminho rápido para a transformação digital. As transportadoras estão num momento de desafio, pois os consumidores se tornaram mais digitais, então os produtores, para atender a esses consumidores, estão se tornando mais digitais também e pressionando seus parceiros de transporte a se atualizarem na mesma velocidade. Quem não conseguir se atualizar, vai perder mercado. Porém, a grande barreira é cultural, pois muitas transportadoras não sabem que caminho tomar para se tornar digital e é claro que muitas empresas vão vender soluções de tecnologia para supostamente “digitalizar” as transportadoras, mas eu não acredito que um software mude uma empresa, porque empresas são feitas por pessoas e as pessoas é que precisam mudar, precisam vivenciar a experiência digital e não serem apendas usuárias do sistema A ou B. A plataforma da TruggHub não será sozinha, também, a solução. Por isso procuramos complementar a parte tecnológica com a vivência da logística digital, participando das operações junto com os clientes e parceiros.
RF: Como experimentar o serviço oferecido pela empresa?
AC: Essa é a parte fácil! (rs) É super simples experimentar. As transportadoras interessadas só precisam fazer o cadastro gratuito por 14 dias e participar das ofertas publicadas, lançando suas propostas. É possível experimentar também as funcionalidades de emissão de documentos, como CTe, MDFe, CIOT e averbação automática de seguro. Após esse prazo, se gostar, a transportadora precisa contratar um plano, pois nossa premissa é ter apenas participantes pagantes na plataforma, justamente para reforçar o compromisso e a lealdade entre os integrantes. Observamos que em serviços gratuitos não há barreiras ou controles de comportamento, o que abre um espaço terrível para fraudes, o que não toleramos.