Transporte rodoviário sem diesel e livre de emissões
17 de outubro, 2022
A jornada do transporte rodoviário para atingir a meta global até 2050 de zero emissões de carbono foi vista com clareza na IAA desse ano, a maior feira de veículos comerciais do mundo e realizada em Hannover/Alemanha. A quase ausência de veículos movidos ao tradicional motor diesel não deixou dúvidas de que em poucos anos esse combustível deixará de o protagonista do setor e dará lugar a outras formas de geração de energia. Também ficou claro durante o evento que a transição para fontes de energia mais limpas no transporte rodoviário tem sido assunto levado a sério pelos fabricantes de veículos comerciais de todas as partes do mundo.
Entre as principais soluções apresentadas, o foco maior se concentra em baterias elétricas, Célula de Hidrogênio gás (GNC, GNL, biometano) e HVO (óleo vegetal hidro tratado). Pouco citado, este último tem grande potencial e deverá ser uma dos substitutos do diesel fóssil no Brasil. Fabricantes de caminhões, ônibus e de modelos leves direcionados ao setor de transporte mostraram o quanto avançaram e poderão continuar avançando para disponibilizarem fontes mais limpas de energias na jornada para a redução das emissões de carbono do setor de transporte, estimada hoje em 14% a nível global.
Mercedes-Benz, Scania, Iveco e Ford, entre outras marcas conhecidas no Brasil e fornecedores da indústria automotiva, como a ZF, investem há anos em tecnologias soluções livres de emissões maior parte baseadas na eletricidade, seja de baterias elétricas ou das células de combustível (tecnologia que produz eletricidade a partir da reação do hidrogênio com o oxigênio). Por conta dessa realidade não faltaram anúncios de datas e prazos para a introdução de veículos livres de emissões nos mercados mais desenvolvidos (leia-se Europa, América do Norte e Japão).
Mercedes-Benz Actros movido a célula de combustível
Portanto, sem previsão para menos desenvolvidos e carentes da infraestrutura básica para os novos tempos, embora o Brasil tenha a seu favor o fato de ser um dos maiores mercados de caminhões e ônibus de todos fabricantes. Na Europa, mesmo com as parcerias feitas entre grandes grupos do setor automotivo, há ainda um grande trabalho a ser feito no desenvolvimento de tecnologias e instalação de redes de abastecimento dos veículos para atender ao que hoje é proposto em termos de eletromobilidade, tanto nas cidades quanto nas rodovias
Apresentado pela primeira vez ao público na Feira, o Mercedes-Benz eActros LongHaul tem autonomia de cerca de 500 quilômetros com uma única carga de bateria. Com início de produção em série previsto 2024, esse caminhão foi anunciado pela Daimler Truck como sua maior novidade dessa edição da IAA e conquistou o prêmio Prêmio “2023 Truck Innovation Award”, concedido pelo mesmo júri do Truck of the Year para caminhões inovadores.
O conceito tecnológico global e inovador da tecnologia de bateria LFP do produto foi decisivo para a votação, assim como o novo eixo elétrico foram decisivos para a premiação do eActros LongHaul. Suas baterias incorporam tecnologia de célula de fosfato de ferro-lítio que poderão receber carga de 20% a 80% em menos de 30 minutos em estação de recarga com potência de cerca de um megawatt. Os primeiros testes em vias públicas estão previstos para perto do início da produção em série.
Outro caminhão elétrico da marca, o eActros 300, é um cavalo mecânico para distribuição de carga preparado para tracionar todo tipo de semirreboque europeu dentro do comprimento máximo permitido. Com produção prevista para o segundo semestre de 2023, esse caminhão indicado para trechos mais curtos utiliza três baterias que garantem autonomia de até 220 quilômetros com uma carga.
O Grupo Daimler Truck apresentou também o eActros para distribuição urbana já produzido em série e também o eAtego para o segmento médio, bem como o Econic, um veículo com vocação para coleta de resíduos. Para o segmento de leves, um dos novos produtos da marca é o FUSO eCanter apresentado na IAA duas semanas antes de seu lançamento no Japão, no início de setembro. O veículo atende a várias aplicações na faixa de 4,25 a 8,55 toneladas de PBT e disponibiliza duas opções de cabine: – Standard (com 1.695mm de largura) e Confort (1,995mm de largura) e seis diferentes distâncias de entreeixos, de 2.500mm a 4.750mm.
Nikola a célula de hidrogênio
Esse caminhão poderá servir de modelo no futuro para o ingresso da Mercedes-Benz do Brasil no segmento de caminhões elétricos para distribuição urbana, levando-se em conta que a montadora não tem ainda qualquer produto movido a bateria no mercado brasileiro. O eCanter apresentado na IAA Transportation conta com um novo tipo de bateria modular com autonomia de até 70km, 140km ou 200km com uma única carga, além de contar todas as tecnologia e dispositivos de segurança já disponibilizados no Brasil nos caminhões e vans da marca.
Também esteve em exposição o Mercedes-Benz GenH2 Truck movido a célula de hidrogênio. Com autonomia de até 1.000 quilômetros com dois tanques com 40 quilos de hidrogênio líquido em cada um, os primeiros protótipos já encontram em testes desde o primeiro semestre desse ano. Esse caminhão é projetado para o transporte de longa distância com carga útil de 25 toneladas e PBTC de 40 toneladas.
O combustível virá de uma fábrica construída da parceria entre a Daimler Truck e o Grupo Volvo Trucks. O represente a diesel da marca na IAA, por sua vez, foi uma modelo série especial (Actros L) de 400 unidades. Entre as características do veículo constam motor OM 471 do novo Actros Plus, 4% a mais de economia e trocas de marchas até 40% mais rápidas.
Eixos, motores e platafomas
Um sistema modular e integrado de acionamento central elétrico da ZF, identificado com CeTrax 2, é também uma tecnologia de propulsão que estará presente em caminhões e ônibus. Com produção em série a partir do ano que vem, para atender a DAF Caminhões, essa tecnologia conta com dois motores elétricos refrigerados a óleo, inversores e transmissão de três velocidades. Com os principais componentes integrados em uma única unidade, o CeTrax 2 possibilita que o caminhão seja tracionado por motor elétrico ou a combustão. Cada um dos motores elétricos tem potência de 360KW e 24.700 Nm.
Tecnologias ZF
A transmissão é de três velocidades com mudanças contínuas, cujas trocas de marchas são imperceptíveis pelo motorista. O CeTrax 2 permite a eletrificação rápida de caminhões e ônibus novos ou usados permitindo que operem com motor elétrico ou a combustão. Troca de motor a diesel pelo acionamento central já acontece na Alemanha e pode ser instalado em veículos com capacidade de carga de 7,5 a 44 toneladas de PBTC.
Outra tecnologia da ZF para a propulsão de veículos pesados é o eixo elétrico capaz de operar com sistema híbrido, frear e recuperar energia de frenagem. Trata-se de uma combinação de semirreboque elétrico e motor híbrido com capacidade de economia de combustível entre de 10 a 15% nas rodovias. Uma vez dotado de inteligência, junto com o cavalo mecânico o semirreboque passa a transmitir dados da condução.
Essa tecnologia será disponibilizada no Brasil em 2023, bem como o sistema de frenagem inteligente com plataforma ABS e EBS (cérebro do semirreboque, pois controla peso da carga e a frenagem), inclusive para suspensão mecânica; pressão dos pneus; controle de marcha à ré etc. O programa de semirreboque inteligente conta com mais de 40 funções de segurança e conforto para o motorista. Todas as informações podem ser combinadas com a telemetria e serem enviadas ao transportador.
Célula de Hidrogênio
Com a meta de zerar as emissões até 2040, a Iveco conta com parcerias de relevância como a Nikola, Hyundai e uma fabricante de baterias instalada no Texas, Estados Unidos, para o desenvolvimento de veículos livres de emissões até 2040. A fabricante italiana apresentou dois grandes destaques na IAA Transportation, sendo um deles o caminhão pesado Nikola movido a célula de combustível. A fábrica conjunta com a startup norte-americana Nikola para a produção de veículos pesados está instalada a fica em Ulm, Alemanha.
Daily cmovieda a célula de hidrogênio
O cavalo mecânico 6×2 movido a célula de combustível em exposição conta com cinco tanques de hidrogênio atrás da cabine e também com eixo elétrico. Sua principal vantagem é a autonomia de 800 quilômetros. Outro cavalo mecânico com a marca Nikola em destaque na parte frontal (um Iveco S Way), em exposição é movido a bateria elétrica com autonomia para 500 quilômetros e previsão para ser comercializado no mercado europeu em 2024. Todos os caminhões elétricos e movidos a célula de combustível terão a marca Nikola, que cuja Startup teve parte adquirida pelo Iveco Group.
Outro destaque da Iveco na IAA desse ano foi a Daily movida a célula de combustível. Fruto de parceria com a Hyundai, o veículo conta com seis tanques de hidrogênio e autonomia para 700 quilômetros contra cerca de 300 quilômetros da versão elétrica também lançada na feira, a qual conta com uma solução técnica de carregamento para recarga em qualquer lugar em 1h30.
A montadora levou também para o evento o ônibus e-Way 100% elétrico e o ônibus a gás Street Way. Aqui no Brasil a Iveco prepara o Iveco Hi-Way a gás para o lançamento em agosto ou setembro de 2023. O projeto conta 20 caminhões, mas nem todos estão rodando em testes pelo País com acompanhamento de parceiros e técnicos da fábrica. Os veículos são equipados com motor Cursor 13 importado, porém com certos componentes feitos no Brasil. De acordo com o CEO da montadora, Márcio Querichelli, quatro concessionárias da rede Iveco em Minas Gerais, Paraná e São Paulo já estão certificadas para os caminhões movidos a gás.
A Iveco tem obtido bom desempenho na América Latina, sendo a região a segunda mais importante na produção e vendas de veículos, portanto, estratégica para o Iveco Group. Por conta dessa relevância, a marca continuará a receber investimentos para manter o avanço no continente, onde as vendas totais representam 12% contra 75% na Europa. Especificamente para o Brasil já está sendo pensado o início do serviço de locação de caminhões e vans, num formato em que o cliente paga só o que usar, como já funciona na Europa.
Motores a gás
Executivos da Scania estimam que 53% das vendas da marca sejam de caminhões elétricos nos próximos anos, embora reconheça que atualmente falta a infraestrutura necessária de carregamento, para a qual se uniram na Europa os Grupos Traton, Daimler Truck e Volvo Trucks. A meta é ter 1.700 pontos no continente Europeu dentro cinco anos. Já sobre o Brasil, na visão dos dirigentes da companhia o País tem limitações para os veículos elétricos, porém conta outras soluções mais viáveis que a eletricidade, como o biometano, gás natural, biodiesel e HVO.
Scania Super com motor de 550cv
Durante o evento na Alemanha, a Scania apresentou dois novos motores a gás de 420 e 460cv que estarão também expostos na Fenatran, em São Paulo. Os propulsores vão chegar com o propósito de fortalecer as vendas de caminhões a gás da Scania no País, onde a potência máxima atualmente é de 410cv. Até setembro desse ano a montadora entregou ao mercado brasileiro 630 caminhões a gás com motor ciclo Otto.
No estande da montadora em Hannover foram expostos 14 veículos elétricos e a diesel entre ônibus e caminhões e motores a gás. Umas principais novidades foi 45 R um cavalo mecânico 100% elétrico para até 40 toneladas de PBTC. Na configuração 4×2 e entreeixos de 4.150mm, o veículo é equipado com transmissão de seis velocidades. As primeiras entregas no mercado europeu estão previstas para o final de 2023.
Um caminhão gás em exposição, equipado com motor de 410cv idêntico aos que rodam no Brasil, porém com 8 tranques (quatro de cada lado) com capacidade total para 240m³, está previsto para rodar na Alemanha com motor de 460cv e 2.300 Nm, além nova caixa de câmbio G25 de 12 velocidades (com uma marcha crawler e uma1 overdrive) com trocas mais rápidas. Também esteve exposto o novo motor a diesel de 13 litros disponível nas potências de 420, 460, 500 e 560cv. Com dois comandos de válvula de alta pressão e freio auxiliar de cabeçote, o propulsor conta com sistema SCR de tratamento dos gases.
Apesar de todo o aparato para novas formas de energia, estima-se que nos próximos 30 anos cerca de ¾ do planeta irão usar motor a diesel. Dentro desta expectativa, a Scania se sobressai como a única fabricante do setor que desenvolveu uma nova família de motores inclusive para atender as demais empresas do Grupo Traton. A MAN e a International começam a usar motor Scania em seus veículos a partir de 2024; já a Volkswagen Caminhões e Ônibus em 2028. O compartilhamento será apenas da parte física do motor, porque a inteligência (parte de software) cada marca continuará usando a sua.
Vans
Vans são veículos fundamentais na cadeia logística para a entrega de última milha. Nesse segmento a Ford se destaca no continente europeu com mais de 9 mil unidades vendidas em 2022 e 15% de participação de mercado. Nesta edição da IAA Transportation, a empresa fez o lançamento da E-Transit Custom com bateria para autonomia de 380 quilômetros e capacidade de carregamento rápido de 125Kw. Lançou também a versão Ecoblue com motor a gasolina de 110 cv, 136 cv, 150 cv e 170 cv, mais a transmissão manual de seis velocidades, além da opção para diferencial autoblocante. A Transit Custom será produzida pela Ford Otosan, em uma nova fábrica na Turquia.
Transit Custom
A gama Custom disponibilizará também a versão híbrida plug In, podendo ser usada na versão elétrica em centros urbanos e motor a combustão nas estradas. O trem de força combina um motor a gasolina de 2,5 litros com uma bateria de 11,8Wh para condução elétrica. A autonomia e de até 53 quilômetros e conta também com 2,3 Kw de potência para a utilização de ferramentas através de um sistema onboard.
Outro lançamento da empresa, também para o mercado europeu, são as soluções Ford Pro, uma plataforma única que integra veículos com software, carregamento e serviços conectados. O objetivo da empresa é otimizar a operação dos clientes que utilizam vans na medida que acontece a transição para eletromobilidade.
Enquanto se destaca no mercado europeu, no Brasil a Transit atingiu a venda de 1000 unidades um ano após seu retorno ao País ocorrido em outubro de 2021. O diretor da Divisão de Veículos Comerciais da Ford América do Sul, Guillermo Lastra, disse que o foco na Europa são as soluções de conectividade e que no Brasil acontece o mesmo alinhamento com a conectividade.
Em sua opinião, é preciso um período de experiência para o usuário de veículos comerciais reconhecer os benefícios da conectividade. Isso acontece em todo o mundo e não está sendo diferente no Brasil. A Transit comercializada no Brasil e demais mercados da América do Sul é montada na fábrica da Nordex no Uruguai. Equipada com motor turbo 2.0 de 170cv e torque de 39,7 kgfm é a mais potente da categoria.
A Transit é oferecida no Brasil em duas opções, ambas de teto alto. Uma delas é a L2H3, de comprimento médio (com diâmetro de giro de 11,9 metros) e capacidade volumétrica de 10,7 metros cúbicos e capacidade para 1.222kg de carga líquida. A versão L3H3, a longa, tem capacidade para 12,4m cúbicos e 1.181 kg de carga e diâmetro de giro de 13,3metros. Ambos os furgões contam com 10 ganchos para amarração de carga e as portas traseiras abrem até 270 graus. De acordo com a Ford, já foram vendidas mais de 10 milhões de modelos Transit em 65 países.
Fonte: João Geraldo/ O Carreteiro Foto: Divulgação