O impacto da transformação digital na infraestrutura de transportes
02 de março, 2020
Com uma infraestrutura 4.0, em que todo o ecossistema de negócios de transporte está conectado, é possível criar modelos de negócios que combinam sustentabilidade, eficiência e segurança com a geração de novas fontes de receita.
Uma falta de infraestrutura que compromete a competitividade de toda a economia do continente – essa é a realidade do setor de transportes na América do Sul. De acordo com o Índice de Competitividade Global (Fórum Econômico Mundial, 2019), ao comparar continentes, a América do Sul supera apenas a África Subsaariana em qualidade de infraestrutura. A baixa qualidade e eficiência de estradas, aeroportos, ferrovias e portos aumentam os custos, causam acidentes, atrasos e perdas no comércio local e internacional, além de limitar a qualidade de vida nas cidades. Contudo, apesar da pequena capacidade de investimento dos governos, o uso de tecnologias digitais oferece a possibilidade de reduzir essa fragilidade.
Como em qualquer outra indústria, portos, aeroportos, ferrovias e estradas também estão em processo de transformação digital. Tecnologias baseadas em internet das coisas (IoT), inteligência artificial (IA) e computação em nuvem têm o potencial de tornar a infraestrutura mais segura, eficiente e sustentável, mas também podem ser direcionadas para desenvolver novas receitas e modelos de negócios.
Na América do Sul, algumas das grandes empresas desse setor estão usando a tecnologia para melhorar o desempenho operacional, aumentar a eficiência energética, evitar interrupções não planejadas, reduzir custos e aprimorar a experiência do cliente.
Em geral, com base no modelo de maturidade para aeroportos, da Arthur D. Little (consultoria norte-americana), podemos definir o processo de transformação digital da infraestrutura de transporte em quatro estágios. Na primeira etapa, os processos são completamente analógicos e manuais. Na segunda, alguns processos são automatizados, mas não integrados a um sistema. No estágio 3, a maioria das operações é automatizada e integrada a um sistema de gerenciamento.
Da fase 1 à fase 3, o uso de tecnologias digitais ajuda a reduzir custos, aumentar a eficiência e a sustentabilidade, e aprimorar a experiência do usuário. Porém, com uma infraestrutura 4.0, em que todo o ecossistema de negócios de transporte está conectado, é possível criar modelos de negócios que combinam sustentabilidade, eficiência e segurança com a geração de novas fontes de receita.
Mas é importante destacar que a transformação digital não é só da aplicação de novas tecnologias, mas também do gerenciamento, conhecimento técnico, das habilidades da força de trabalho e, acima de tudo, de um objetivo comercial claro.
A infraestrutura de transporte consome muita energia. Aumentar a eficiência é um imperativo para os negócios e a sociedade, mas envolve um grande desafio que pode ser superado pelas tecnologias digitais. Os aeroportos de Bogotá, Brasília, Salvador, Santiago e Florianópolis, por exemplo, estão usando microrredes com energia solar para uso próprio, reduzindo custos e evitando interrupções. O aeroporto de Brasília empregará energia solar para alimentar aeronaves nos terminais, gerando novas receitas e apoiando as companhias aéreas na redução da sua pegada ambiental.
Os maiores aeroportos da região estão orientados para esse processo de mudança. Nas cidades de Bogotá, Guarulhos, Santiago e Buenos Aires estão usando automação avançada, sistemas de serviço e robótica para aumentar a eficiência operacional e melhorar a experiência do usuário. O aeroporto de Santiago está adotando a modelagem de informações de construção – um sistema de informações em três dimensões que reduz custos, tempo e riscos no processo de construção.
Esse mesmo tipo de tecnologia já está sendo utilizado pela Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), pelo Metrô de São Paulo e pela Rumo Logistica (companhia ferroviária e de logística brasileira) para novos projetos. O Metrô de São Paulo já usa realidade aumentada para melhorar a experiência do usuário, e a realidade virtual está sendo desenvolvida para novos projetos na Rumo e na MRS Logística. Além disso, os metrôs de Santiago e São Paulo estão adotando a tecnologia de reconhecimento facial para ajudar a melhorar a segurança.
A realidade aumentada também está sendo aplicada pelos portos, como o de Santos, para reduzir acidentes de trabalho. Os portos de Santos, no Brasil, Cartagena e Buenaventura, na Colômbia, e Valparaíso, no Chile, estão adotando plataformas blockchain para reduzir a burocracia e melhorar o controle de carga, a rastreabilidade e diminuir a corrupção. Os portos de Santos, APM Terminals Callao, no Peru, Valparaíso e Barranquilla, na Colômbia, estão integrando operações portuárias e o ecossistema (agentes marítimos, agências alfandegárias e transportadoras), resultando em um processo logístico mais eficiente.
No caso de Barranquilla, esse novo processo – possibilitado pela internet das coisas, pela computação em nuvem e pela mobilidade – visa integrar as operações portuárias com caminhões de carga e ferrovias, enquanto utiliza dados resultantes para gerar novas receitas, fazendo a empresa sair de um porto operador (Infra 3.0) para uma plataforma de logística portuária (Infra 4.0).
Segundo dados analisados a partir de projetos da Schneider Electric, no nível operacional, as tecnologias digitais podem reduzir os custos de energia nos aeroportos em aproximadamente 30%, abaixar os custos totais de propriedade em metrôs em 15%, melhorar a eficiência operacional em 20%, diminuir os custos de manutenção em ferrovias entre 10% e 20% e, finalmente, elevar a eficiência operacional nos portos em 20%.
Já em um nível mais amplo, essas tecnologias podem reduzir os investimentos necessários para fechar as lacunas de infraestrutura dos países. Para esse fim, os governos poderiam incentivar o uso de inovações que aumentem a eficiência, reduzam riscos e tornem o transporte mais sustentável. Os investidores também devem incentivar a adoção de tecnologias digitais para aumentar a competitividade em longo prazo. Por fim, as operadoras e concessionárias têm a oportunidade de estruturar novos modelos de negócios muito mais competitivos.
É difícil medir ganhos sociais e ambientais, mas melhorar a qualidade de vida nas cidades e reduzir os custos de logística de produtos são resultados fundamentais. Além disso, enfrentamos a necessidade de uma diminuição urgente das emissões de gases de efeito estufa pelo sistema de transporte, bem como de um aumento da resiliência da nossa infraestrutura diante do desdobramento das mudanças climáticas.
Fonte: Época