As emendas de relator e os parlamentares insaciáveis

As emendas de relator e os parlamentares insaciáveis

08 de julho, 2022

O Congresso Nacional voltou a dar mostras de que seu apetite é insaciável quando se trata do dinheiro tirado do cidadão e das empresas por meio dos impostos. O caráter impositivo das emendas de relator, ou RP9, que já levou a uma queda de braço entre o presidente Jair Bolsonaro e os parlamentares em 2020, está de volta pelas mãos do senador Marcos do Val (Podemos-ES), relator do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2023. A Comissão Mista de Orçamento aprovou o relatório do senador, que está pronto para ir ao plenário.

As emendas de relator, conforme explicação do próprio site do Congresso, têm uma função bastante específica, que é a de corrigir erros ou omissões na peça orçamentária. Mas, a partir de 2019, ela ganhou uma função bem diferente: contornar as regras que garantem paridade para todos os parlamentares nas emendas individuais, beneficiando determinados grupos e reabrindo o balcão de negócios envolvendo a liberação de verbas do orçamento. Na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2020, as emendas de relator somavam inacreditáveis R$ 30 bilhões, o dobro de todo o montante previsto para emendas individuais e de bancada – ainda por cima, o relator, deputado Domingos Neto (PSD-CE), decidira que sua execução seria obrigatória. Bolsonaro vetou o caráter impositivo das RP9, e um acordo com o Congresso permitiu que essas emendas permanecessem no Orçamento, mas somando R$ 20 bilhões, de execução facultativa.

As emendas de relator são um instrumento que nem mesmo deveria existir – ao menos não na forma como elas vêm sendo empregadas atualmente. Que, além disso, ainda sejam de execução obrigatória é um absurdo completo.

Mesmo essa solução, no entanto, introduzia uma aberração no orçamento federal, pois as RP9, além de não respeitarem a alocação idêntica a que todo parlamentar tem direito nas emendas individuais, tinham pouquíssima transparência ao levar apenas o nome do relator, e não do parlamentar que as havia solicitado – embora o governo, obviamente, soubesse muito bem quem estaria agradando ao liberar o dinheiro. As denúncias do “orçamento secreto” ou “paralelo” mostraram como as RP9 estavam servindo a fins nada republicanos, a ponto de o STF ter determinado a suspensão da execução destas emendas no Orçamento de 2021 e exigido transparência na divulgação dos reais “autores” das emendas, solicitação que o Congresso tratou com desdém.

No projeto da LDO de 2023, Marcos do Val incluiu R$ 16,5 bilhões em emendas RP9, mas o valor ainda pode subir para R$ 19 bilhões. Ele afirma que os problemas anteriores não devem se repetir, pois será obrigatória a identificação do parlamentar responsável por solicitar cada emenda, que terá de contar também com o aval do presidente da Comissão Mista de Orçamento, não apenas do relator-geral. Essas, no entanto, são alterações menores, que não atacam os principais problemas das emendas de relator: seu uso com finalidades diversas daquelas para as quais foram criadas, e o fato de tirarem ainda mais margem de manobra do Poder Executivo ao reduzir a chamada “despesa discricionária”, de livre escolha do governo, que já corresponde a uma porcentagem ínfima do orçamento.

As emendas de relator são um instrumento que nem mesmo deveria existir – ao menos não na forma como elas vêm sendo empregadas atualmente. Que, além disso, ainda sejam de execução obrigatória é um absurdo completo. A pretensão de ressuscitar o caráter impositivo das RP9 é mais uma prova de que os parlamentares estão interessados apenas em garantir seu naco do orçamento, amarrando ainda mais as mãos de quem sair vencedor da eleição de outubro.

Texto e foto Gazeta do Povo 

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